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quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Meia dúzia de dúzias


Há três anos, neste dia dezessete de janeiro, realizou-se a comemoração do aniversário de meu nascimento, num churrasco com direito a bolo e velinhas, uísque, cerveja e vinho, ocasião em que distribuí para meus amigos uma gravação de imagem e som que intitulei “Romeu Oliveira Gurgel fazendo 69” filmada e editada pela minha querida Chellimi Cage, com textos meus, quase todos improvisados e sob minha direção.

Era grande minha expectativa pela festa, como sempre, o dia em que me sentia mais feliz em todo o ano, pois não tenho dúvidas de afirmar que adoro ficar mais velho, receber abraços e beijos e ter gente ao meu lado.

Já até pensava na próxima festa.

Entretanto, no Natal do ano anterior, poucos dias antes da minha festa, um triste fato envolveu um de meus filhos e o ambiente da festa foi tenso e não contou com a presença de todos, com justificativas por mim aceitas, sem grande credulidade.

Temia-se que ocorresse uma vingança contra meu caçula, injustamente acusado por conhecido estelionatário de tê-lo tentado assassinar.

A festa correu normal e feliz.

Dias depois, verdadeira catástrofe abalou nossa família, com a decretação e efetivação de sua prisão injusta.

Minha vida se transformou no maior martírio que jamais imaginara pudesse passar e, durante dois anos, dois meses e dois dias peregrinei por juízos e tribunais, de todas as instâncias. Visitei presídios, os mais variados, eis que o chamado sistema prisional de nosso país e estado é um complexo de incoerências e tristezas, sofrimentos e privilégios, coisas que nem parecem ser verdadeiras. Recorri a tantas pessoas quantas pude, sem sucesso.

Contei com amigos. Alguns me suportaram. Alguns me confortaram. Alguns me evitaram. Alguns me esqueceram, como se tivesse para eles morrido. Somei aqueles que entenderam meu sofrimento e os enalteço, sempre, quer pela dignidade, quer pela compreensão e solidariedade.

Não comemorei 70 anos. Não comemorei 71 anos. Recebi os muitos abraços, mas chorava por dentro, lembrando a visita que fazia pela manhã ao meu “menino” tão frágil e tão incapaz como quanto lhe trocava as fraldas. Sua ansiedade e sua esperança estavam sempre nos seus olhos que eu evitava mirar, com medo de chorar, pois sua confiança em mim e minha pequenez diante do “sistema” eram o abismo que não me deixava dormir e quando conseguia, os reduzidos minutos se constituíam de terríveis pesadelos.

Ano passado, em abril, acabou a terrível falsa e chegou a liberdade esperada.

Tudo que queria para este ano, quando seis vezes doze, meia dúzia de doze ou meia dúzia de dúzias de anos atinjo, era estar ao lado dos meus três filhos homem, num almoço dos quatro Gurgel e, à noite, reunir as duas filhas e toda a família, com as mulheres de meus filhos que não são noras, mas filhas também, e os maridos de minhas filhas, que não são genros, mas filhos também e meus maravilhosos netos.

Pensei em dividir a minha vida, até então, em seis dúzias, meia dúzia de dúzias ou de doze anos, das quais as duas primeiras seriam minha infância e juventude, em Itabirito, os demais anos aqui no Rio. A terceira engloba o período de meu primeiro casamento. A quarta da segunda união. A quinta do último casamento e a sexta o período atual.

Claro que a divisão não é exata e nem mesmo pode ser tão bem definida, mas serve como um comparativo, uma estratificação meramente simbólica.

Foi, então que, na semana passada recebi uma ligação do mais velho, dizendo-se o primeiro da lista do almoço e definindo a data como prioridade, escolhesse eu o local. Cheio de alegria, usei dos frios meios modernos para convidar o segundo, que disse que iria tentar remanejar alguns compromissos e falei com o mais novo, com seu de acordo.

Ansiei até ontem, imaginei quem mais gostaria de estar comigo nesse dia e hora e me senti feliz de poder estar com meus pequenos grandes “Gurgel” até que outro telefonema tudo cancelou, pelo perdimento da prioridade em razão do ofício e de viagem de trabalho.

Há mais de cinco anos que não consigo reunir meus filhos e, sabe Deus, talvez jamais o faça.

Castigo, com certeza, por atos que talvez tenha praticado no passado e que o Senhor da Justiça me faz pagar.

Esta página, entretanto, não é de tristeza, nem de inconformismo. Esta página é meu pedido de perdão a Deus e aos meus filhos por não ter sido melhor, nem mais presente, nem mais próximo e para dizer-lhes que não há dádiva maior para mim do que saber que estão livres e a viver suas próprias vidas.

Feliz meia dúzia de dúzias para mim, graças a Deus!

Copacabana, 17 de janeiro de 2013.
Romeu Oliveira Gurgel